Por Professor
Reginaldo de Souza Silva
Recentemente chegou às minhas mãos um livro da autora
sul-coreana Kyung Sook Shin intitulado “Por Favor, Cuide da Mamãe”. O livro me
emocionou de diversas formas e uma delas foi pela universalidade dos princípios
que regem as relações afetivas no interior da família. Gostaria neste momento
em que, de uma forma ou de outra, paramos para pensar em nossas mães, de
convidá-lo a refletir comigo a respeito de alguns desses princípios.
O primeiro deles é a respeito do conhecimento sobre o outro:
quem efetivamente é a nossa mãe? Não pergunto sobre o esteriótipo de mãe
cantado por aí. Pergunto a respeito da mulher que nasceu e cresceu em um
determinado tempo e espaço e por eles foi influenciada. Pergunto sobre uma
pessoa que tem preferências, mas poucas escolhas e que o tempo todo abre mão de
seu próprio bem-estar, de sua própria felicidade para atender ao interesse
quase sempre egoísta do marido e o de proteção dos seus filhos.
Hoje pergunto a você: será que conhece a sua mãe? Consegue
enxergar a felicidade dela independente da sua? Isso não é uma tarefa fácil,
pois nos acostumamos a ver os outros sempre através das nossas lentes e somos
incapazes de ver de frente, sem medo, quem é o outro e, portanto, do que ele
realmente precisa.
Sua mãe não nasceu no mesmo dia que você e é preciso ter
isso muito claro para que possa enxergá-la independente da tua existência e
para que deixe de responsabilizá-la por tua vida, seja isso para o bem ou para
o mal. Pergunto: será que conhecemos nossa mãe? O que a deixa feliz, a acalma?
Podemos dizer nossa mamãe é feliz? Foi feliz?
O segundo princípio é sobre a necessidade de escutar o
outro: por que é tão difícil escutar o que sua mãe diz? Em uma sociedade que
supervaloriza a juventude, a experiência de vida soa como um barulho irritante
que parece querer impedir tudo o que é divertido e prazeroso. A voz da mãe
alertando para as más companhias, para a violência das madrugadas, para a
correria do trânsito, para evitar as drogas não tem espaço entre os infindáveis
apelos do consumo da alegria.
Pergunto a você, então, o que tem te impedido de ouvir o que
sua mãe fala? Tem tido tempo e paciência de sentar e escutar tudo o que sua mãe
precisa dizer?
Nem tudo que ela disser poderá ser verdadeiro, justo ou
real, isso é fato, mas não custa nada afiarmos os ouvidos, abrir o coração e
nos despirmos de preconceitos para escutar o que realmente foi dito e não
somente o que queremos escutar.
O terceiro princípio é a respeito da noção da passagem do
tempo: como você pensa e age à medida que sua mãe envelhece (e com a velhice
aparecem suas “manias”, inseguranças, desequilíbrios, falta de força, as dores
que começam e insistem em permanecer etc.)?
A minha esposa conta que em sua adolescência uma das
experiências que mais a marcou foi presenciar a avó de uma amiga se olhando no
espelho e dizendo: “_ Um dia você é jovem e no outro descobre que envelheceu”.
Daquele dia em diante decidiu que o tempo não passaria por ela sem que soubesse
em que estágio da vida estava. O tempo passa para todos, mas sua mãe
envelhecerá primeiro do que você. E eu pergunto: você está preparado para isso?
Saberá respeitar a passagem do tempo, celebrando a existência de quem conseguiu
sobreviver a juventude?
Por fim, segundo Kyun Sook Shin, a palavra “Mamãe”, apesar
de familiar, esconde um apelo: por favor tome conta de mim, pare de gritar
comigo e faça um afago na minha cabeça, fique do meu lado, tenha eu razão ou
não.
Você está pronto para isso? Está pronto para se doar a quem,
certa ou errada, fada ou monstro, foi quem procurou as formas de garantir que
sobrevivesse aos primeiros anos de vida e alçasse os primeiros voos? Se sim,
corra para celebrar com a sua mãe o seu dia. Se não, comece a partir de hoje a
praticar os princípios do conhecimento, da escuta e da passagem do tempo como
exercícios para se tornar uma pessoa melhor.
REGINALDO DE SOUZA
SILVA, Doutor em Educação Brasileira, professor do Departamento de Filosofia e
Ciências Humanas da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia. Email:
reginaldoprof@yahoo.com.br
Postagem publicada originalmente por Rodrigo Ferraz, Blog da Resenha Geral
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